Auto investigação – Meditação sugerida por Ramana Maharshi

Durante muito tempo, li sobre a auto investigação sem conseguir entender como ela funcionava, e por que era tão difícil as pessoas entenderem que pode trazer resultados. Demorei alguns anos lendo os livros sobre como ele orientava seus discípulos para poder compreender que realmente podemos ter resultados práticos em nossa vida. Não somente nos levar à iluminação que é o objetivo último, mas também aliviar o sofrimento humano através de uma compreensão mais profunda do eu e do Eu Sou.

Ramana Maharshi atingiu a iluminação aos 16 anos, quando teve uma experiência de quase morte. Ele foi tomado por um medo muito grande e uma sensação de que iria morrer; então deitou-se e aceitou que iria morrer, chegando inclusive a parar de respirar. Notou que apesar do corpo estar inerte e sem respirar ele ainda existia; neste momento compreendeu que ele não era o corpo e que existia mesmo que o corpo morresse. Nesse momento seu coração voltou a bater e ele foi tomado por uma sensação muito profunda que lhe trouxe uma alegria muito grande; compreendeu que ele existia além da identificação com o corpo e das sensações dos sentidos, além da mente, além do Ego; descobriu que no coração habita o Eu Sou que é pura Existência, Consciência e Bem Aventurança. Esta sensação de plenitude fez com que ele perdesse totalmente o interesse pelas coisas mundanas, estudo, lazer ou qualquer outra coisa que o tirasse deste estado de plena felicidade; sua família não concordando com isso começou a pressioná-lo a que estudasse e tivesse mais atividades além da meditação; vendo que não teria como conciliar, decidiu ir para Arunachala, um nome que lhe chamava como sendo algo sagrado e que descobriu ser em Tiruvannamalai e havia um trem que poderia levá-lo até lá. Escreveu uma carta de despedida à família pedindo que não o procurassem; conseguiu algum dinheiro para a passagem e partiu; chegando lá tirou suas roupas formais, raspou o cabelo, passou a viver como um Sadhu em profunda meditação e em profunda comunhão com o Eu Sou que é o estado de Consciência, Existência e Bem Aventurança. As pessoas que frequentavam o templo vendo sua profunda dedicação a Deus passaram a cuidar dele, alimentando-o e protegendo-o quando necessário; nesse período adotou o silêncio e ficou muitos anos sem falar. Ajudou-o neste período o fato de ter sido reconhecido por um santo como uma alma elevada; assim, as pessoas começaram a se aproximar e a sentir a graça de um homem santo; apesar de ele não falar, sua presença exalava os atributos de um sábio e santo. Assim, por mais que se isolasse, sempre era encontrado e reverenciado. Alguns anos mais tarde começou a escrever respostas às perguntas sobre como alcançar aquele estado em que vivia, mas especialmente seu exemplo de como viver plenamente. Foi-se criando à sua volta um local para que pudesse receber a todos e transmitir seus ensinamentos e seus exemplos de amor e sabedoria.

Recomendava a todos a auto inquirição, que é a pergunta “Quem Sou Eu?” A explicação para esta pergunta é que em nosso coração este estado de Consciência, Existência e Bem Aventurança já existe, mas está encoberto pelo nossos pensamentos, ou seja, este estado está além dos pensamentos, sendo um estado de consciência ampliada superior aos pensamentos, e que quando os pensamentos surgirem, não importa quantos, você pergunta “Para Quem esses pensamentos surgem”, e então você vai em busca de quem é este eu, perguntando “Quem Sou Eu?” Quando você fizer esta pergunta seu ego vai em busca da resposta, que está lá no seu coração, e cada vez que você repetir o processo estará mais próximo de seu Eu Sou, que é Existência, Consciência e Bem Aventurança.

Neste momento estes pensamentos desaparecem, assim como desapareceram da mente do sábio de Arunachala. Ele repetiu este processo até que todos os pensamentos desapareceram junto com o ego/mente, que é a identificação com o corpo, a identificação com o primeiro eu, aquele que diz,” eu sou o corpo”, meu corpo, minha casa, meus pensamentos.

Aqui cabe a visão de como funciona a nossa mente/ego identificada com o eu de uma forma bem prática e como foi que consegui entender porque isto acontece. O Eu Sou, que é poder infinito e fonte de todo poder, é indivisível. No entanto, dentro desse Eu Sou indivisível há cinco energias, com funções variáveis e que operam simultaneamente. São elas: Criação, Preservação, Destruição, Velamento (Maya) e, Graça. A quinta energia, Graça, neutraliza e remove a quarta que é o Velamento (Maya). O amor cobre a multidão de pecados, citado em Provérbios 10: 12.

Quando o Velamento (Maya) está ativo, o meio de dissolvê-lo é o caminho mostrado por Ramana Maharshi: deve-se fazer a auto inquirição e discernir (investigar) o que é real e o que é irreal (irreal é tudo aquilo que muda com o tempo). É o poder do Velamento que nos faz acreditar na realidade de coisas que só têm realidade na nossa imaginação; se você perguntar “o que são estas coisas imaginárias?” A resposta é “Tudo o que não é o Eu Sou sem forma.” Só o Eu Sou é real e eterno; todo o resto é uma invenção da nossa imaginação.

Precisamos ficar atentos aos hábitos da mente, que são identificações equivocadas, e os padrões de pensamentos repetidos que ocorrem frequentemente. São estes hábitos que encobrem a experiência do Eu Sou. Estes hábitos equivocados chamam sua atenção e o puxam para fora, para o mundo, em vez de para dentro, para o Eu Sou. Isso acontece tantas vezes e tão continuamente que a mente nunca tem a chance de descansar ou de compreender a sua real natureza. A maioria de nossos hábitos e padrões de pensamentos aparecem repetidamente, mesmo que não desejados. A maioria de nossas ideias e pensamentos são incorretos. Quando surgem elas nos condicionam a pensar que são corretos e verdadeiros. Os hábitos fundamentais, como “eu sou o corpo” ou “eu sou a mente” ou, “esse é o meu mundo” têm aparecido em nós tantas vezes que aceitamos automaticamente como verdadeiros. Você só pode escapar dos hábitos da mente ao permanecer firme na consciência Eu Sou como consciência. Seja quem você é. Seja como você é. Apenas fique quieto. Esta é uma recomendação clássica de Ramana Maharshi para seus discípulos; ela quer dizer que você deve permanecer sempre no estado do Eu Sou, (Consciência, Existência, Bem Aventurança)

Vou exemplificar e esclarecer através de uma pergunta feita por um discípulo: Qual a maneira mais fácil de me livrar deste “pequeno eu”?

Resposta: Pare de se identificar com ele; se você puder se convencer de que este pequeno eu não tem existência, ele simplesmente desaparecerá. A consciência é universal. Não há limitações, ou “pequeno eu” nela, ela é (Existência, Consciência, Bem Aventurança) o Eu Sou. Se através da Auto Investigação, você for a fonte desse “pequeno eu”, você descobrirá que ele se dissolve em nada. Devemos gerar a compreensão de que somos Consciência, Existência e Bem Aventurança, ou seja, o Eu Sou. Quando esta compreensão se tornar firme, a mente inexistente não irá incomodar você.

Toda vez que você vai dormir você tem a experiência de estar sem a mente. Você não pode negar que você existe enquanto está dormindo e não pode negar que a sua mente não está funcionando enquanto você está no sono sem sonhos. Essa experiência diária deve convencê-lo de que é possível continuar a sua existência sem uma mente. Naturalmente, você não tem a plena experiência de consciência enquanto está dormindo, mas se você pensa sobre o que acontece durante esse estado, você deve entender que a sua existência, a continuidade do seu ser, não depende de modo algum da sua mente ou da sua identificação com ela. Quando a mente reaparece a cada manhã você salta instantaneamente para a conclusão de que “Esse é o eu real”. Se você refletir sobre esta proposição por algum tempo, você verá quão absurda ela é. Se o que você realmente é só existe quando a mente está presente, você tem que aceitar que você não existia enquanto estava dormindo. Ninguém aceitará uma conclusão tão absurda. Se você analisar os seus estados alternados, você descobrirá que é sua experiência direta que você existe, você esteja acordado ou adormecido. Você também descobrirá que a mente só fica ativa enquanto você está acordado ou sonhando. A partir dessas experiências diárias simples deve ser fácil entender que a mente é algo que vem e vai. A sua existência não é eliminada cada vez que a mente deixa de funcionar. Eu não estou lhe contando alguma teoria filosófica; eu estou lhe dizendo algo que você pode validar por experiência direta em qualquer período de vinte e quatro horas de sua vida.

Pegue esses fatos, que você pode descobrir por experimentá-los diretamente, e os investigue um pouco mais. Quando a mente aparece todas as manhãs, não salte para a conclusão habitual: “Esse sou eu; esses pensamentos são meus”. Em vez disso, observe esses pensamentos irem e virem sem se identificar com eles de forma alguma. Se você puder resistir ao impulso de reivindicar cada pensamento como seu, você chegará a uma conclusão surpreendente: você descobrirá que você é a consciência em que os pensamentos aparecem e desaparecem. Você descobrirá que essa coisa chamada mente só existe quando os pensamentos têm permissão de correr livremente.

Você quer alguma experiência que o convença de que o que estou dizendo é verdade? Você poderá ter essa experiência se você renunciar ao seu hábito vitalício de inventar um “eu” que reivindica todos os

pensamentos como “meus”. Seja consciente de si mesmo como consciência somente, observe todos os pensamentos irem e virem. Chegue à conclusão, pela experiência direta, de que você é realmente a própria consciência, e não o seu conteúdo efêmero. As nuvens vêm e vão no céu, mas o aparecimento e o desaparecimento das nuvens não afetam o céu. A sua natureza real é como o céu, como o espaço (sem forma). Apenas permaneça como o céu e deixe as nuvens de pensamentos irem e virem. Se você cultivar essa atitude de indiferença em relação à mente, gradualmente você deixará de se identificar com ela. Não há obstáculo para o Eu Sou se você se lembrar que você sempre É (Existência, Consciência e Bem Aventurança).

O que quer que você faça deve ser feito sem o sentimento de “eu”. Se agir assim, tudo será visto como sendo da natureza de Deus (Entregue a Deus todos os seus atos, ele chama isso de rendição).

Se você fizer Auto Inquirição você obterá energia infinita. Todos os seres, todas as coisas, todas as pessoas no mundo são o seu próprio Eu Sou. Todos eles são indivisivelmente parte de você. Se você puder ver tudo como o Eu Sou, como você pode fazer mal a outro alguém? Quando você tem essa visão clara, o que quer que você faça para os outros, você sabe que isso é feito apenas para o seu Eu Sou. Gostar de uma coisa em vez de outra é ignorância: gostar e amar todas as coisas é sabedoria. Se alguém vê a partir dessa realização que todas as pessoas são seu próprio Eu Sou ela desfruta da mesma paz que se desfruta em sono profundo. A diferença é que se desfruta dela aqui e agora, enquanto se está acordado.

 

Este texto foi extraído dos livros:

– Vivendo Pelas Palavras de Bhagavan a biografia de Annamalai Swami

Satsang Editora. Autor David Goodman

-Maha Yoga – Autor K.Lakshmana Sarma – Satsang Editora

-Autoinvestigação de Bhagavan Sri Ramana

Maharshi – Autor Gambhiram Seshayya – Satsang Editora

– Pérolas de Sabedoria – Vida e Ensinamentos de Ramana Maharshi – Editora Teosófica.